Nascida e registada sob o nome Fanny Antwistle (ou ainda Entwhistle, segundo outros registos da época)[3] a 23 de junho de 1835, em Saint Andrew, Jamaica, apenas dez meses após a promulgação da abolição da escravidão em todo o império britânico, especula-se que a sua mãe, Matilda Foster, seria uma mulher de ascendência africana, nascida na condição de escrava na Elim Estate de Saint Elizabeth, propriedade então da família Foster (também referida como Forster).[4][5] No seu registo de nascimento apenas constava o nome da sua mãe, sendo também especulado que seria filha ilegítima do soldado britânico James Entwistle, falecido com apenas 20 anos de idade em Saint Catherine e sepultado em Spanish Town a 4 de julho de 1835, onze dias após o nascimento de Fanny.[4][6][7]
Durante a década de 1840, Fanny e sua mãe partiram para Inglaterra, constando nos registos locais que em 1851 ambas viviam em Londres, no número 9 de Steven's Place, em Saint Pancras, e trabalhavam como empregadas domésticas.[8]
Em 1857, Fanny casou-se com James Eaton, fotógrafo de retratos e cocheiro de um hansom cab, nascido a 17 de fevereiro de 1838 em Shoreditch.[9] Juntos, tiveram 10 filhos entre 1858 e 1879.[4]
Para sustentar a sua família, durante o fim da década de 1850, Fanny Eaton começou a posar para vários estudantes de artes na Escola de Pintura da Royal Academy of Arts, onde recebia 5 xelins por cada sessão de modelagem e chegava a realizar cerca de três sessões por dia.[4]
As suas características distintivas foram rapidamente apreciadas e usadas pelos artistas para retratar uma variedade de diferentes etnias e personagens, sobretudo figuras históricas e bíblicas, tendo os seus primeiros estudos sido realizados por Walter Fryer Stocks e Simeon Solomon em 1859. Estes últimos esboços, realizados por Solomon, foram pouco depois utilizados como preparação para a obra Mãe de Moisés (Mother of Moses), onde representava as figuras bíblicas de Jochabed e Miriam. A obra foi exibida na Royal Academy durante a Exposição de 1860.[10]
Criando um elo de musa-artista com Simeon Solomon, Fanny Eaton foi então introduzida no círculo dos artistas pré-rafaelistas, começando também a trabalhar como modelo para Rebecca Solomon, Joanna Mary Boyce e Dante Gabriel Rossetti, que a contratou para posar na pintura A Amada (The Beloved) e em vários esboços de retrato,[11] ou ainda Albert Joseph Moore e William Blake Richmond, que a retratou na obra A Escrava (The Slave) (1886).[a][12][13]
A pintura Jefté (Jephthah) de John Everett Millais, realizada em 1867, que revela a modelo de pé, no canto superior direito da tela, terá sido uma das últimas obras onde Fanny Eaton trabalhou como modelo, desconhecendo-se as razões por detrás da sua aposentadoria.[14]
Em 1881, Fanny Eaton ficou viúva, constando a sua ocupação nos registos locais como costureira. Anos mais tarde, partiu para a Ilha de Wight, onde trabalhou como cozinheira doméstica para Fanny e John Hall, um comerciante de vinhos de Portsea.[4]
Em 1911, após começar a apresentar sintomas de demência senil, passou a residir em Hammersmith, Londres, com sua filha Julia Eaton, o genro Thomas Powell e os netos Baden e Connie Powell.[4]
Após uma longa vida como emigrante da classe trabalhadora, Fanny Antwisle Eaton faleceu em Acton, Londres, a 4 de março de 1924, com 88 anos de idade, vítima de síncope cardíaca. Foi sepultada no Cemitério Margravine Road em Hammersmith.
Desconhecendo-se muitos poucos dados sobre a musa dos pré-rafaelistas, as pesquisas para resgatar a sua história de vida foram iniciadas no final do século XX, tendo sido descobertas novas representações da mulher nascida na Jamaica e catalogadas nas últimas décadas.[4]
Em 2005 foi realizada a primeira exposição totalmente focada em representações de pessoas negras na arte vitoriana britânica, denominada de Black Victorians: Black People in British Art 1800-1900, em Manchester. As pinturas onde Fanny Eaton era representada receberam um lugar de destaque, com a Mãe de Sísera de Albert Joseph Moore e O Amado de Rossetti em exibição. A crítica respondeu à visualização dessas pinturas de acordo com as novas inquietações do século XXI, fazendo uma análise de como a sua figura poderia ou não ter sido utilizada de forma objetificada. Outro crítico apontou ainda que a pintura de Rossetti era "anglocêntrica", fazendo não só uso de pessoas de outras etnias num papel subserviente mas também revelando como as normas e a estética europeia eram impostas na imagem de como um negro deveria ser, vestir, aparentar ou agir.[15][16][17]
Em 2019 foi realizada a Pre-Raphaelite Sisters Exhibition na National Portrait Gallery em Londres, que marcou um passo no legado de Fanny Eaton.[18]
Desde 2020, Fanny Eaton é celebrada pelo seu papel como "musa artística e a mulher de cor mais visível da Grã-Bretanha vitoriana".[19]
De outubro de 2019 a janeiro de 2020, ela foi uma das 12 mulheres incluídas na exposição Pre-Raphaelite Sisters na National Portrait Gallery de Londres.[21]
Em 26 de abril de 2020, a sua vida e trabalho foi representado num curto documentário de história da arte para o programa da BBC Radio 1Get Animated!Introducing BBC Arts[22] e o site BBC New Creatives.[23]
Para marcar o Mês da História Negra em outubro de 2020, a revista Prima nomeou a modelo como uma das seis mulheres negras britânicas – junto com Margaret Busby, Claudia Jones, Mary Prince, Lilian Bader e Olive Morris – que “mudaram o mundo”.[24]
Em 15 de outubro de 2020, o poeta Maz Hedgehog apresentou um poema sobre Fanny Eaton como parte do segmento de poesia do Mês da História Negra da BBC Blue Peter.[25]
Em 18 de novembro de 2020, foi homenageada com um Google Doodle.[26]
↑Ferrari, Roberto C., 2014, "Fanny Eaton: The 'Other' Pre-Raphaelite Model", Columbia University Academic Commons, doi:10.7916/D8X92900.
↑Marsh, Jan (2013). «Pictured at Work: Employment in Art 1800–1900». In: Adi, Hakim Adi; Bressey. Belonging in Europe – The African Diaspora and Work. [S.l.]: Routledge. ISBN9781317989769