Filosofia do Oriente Médio

A filosofia do Oriente Médio refere-se às tradições filosóficas desenvolvidas em várias regiões do Oriente Médio, desde a Antiguidade até os tempos contemporâneos. Essas tradições filosóficas incluem contribuições da filosofia egípcia, mesopotâmica, persa, grega, helenística e islâmica medieval. Além disso, o pensamento contemporâneo foi moldado por fatores como o colonialismo e a modernidade. O Oriente Médio desempenhou um papel crucial como encruzilhada de influências culturais e intelectuais, contribuindo significativamente para o desenvolvimento da filosofia mundial.[1]

Filosofia Antiga (aproximadamente 3000 a.C. – 300 a.C.)

[editar | editar código-fonte]

A filosofia no Oriente Médio remonta aos primeiros registros escritos do Egito Antigo e da Mesopotâmia. Embora essas civilizações não tenham desenvolvido sistemas filosóficos comparáveis aos da Grécia Antiga, refletiram profundamente sobre questões éticas, cosmológicas e religiosas. No Egito, a literatura sapiencial, como os Ensinamentos de Ptahhotep, discutia questões de conduta moral, justiça e harmonia social.[2]

Na Mesopotâmia, a filosofia estava entrelaçada com a religião. O épico da criação, o Enuma Elish, descreve a formação do cosmos e a ascensão dos deuses, refletindo preocupações filosóficas sobre a ordem cósmica e o poder divino.[3] O Código de Hamurabi (c. 1754 a.C.) foi um marco no desenvolvimento de sistemas legais e refletia uma concepção primitiva de justiça baseada na retribuição.[4]

Contribuições Filosóficas da Antiguidade

[editar | editar código-fonte]

Na Suméria, os primeiros textos filosóficos abordavam a origem do universo e a relação entre os deuses e a humanidade, como exemplificado no Epopeia de Gilgamesh, um dos textos literários mais antigos do mundo. Esse poema reflete sobre a mortalidade, a imortalidade e o sentido da vida, temas centrais na filosofia posterior.[5]

No Egito Antigo, o arquiteto Imhotep é considerado um dos primeiros a unir a ciência, a medicina e a filosofia em seus ensinamentos, que influenciaram o pensamento sobre moralidade e justiça.[6]

Filosofia Persa (aproximadamente 1000 a.C. – 700 d.C.)

[editar | editar código-fonte]
Ver artigo principal: Filosofia persa

A filosofia persa foi moldada fortemente pelos ensinamentos de Zaratustra (Zoroastro), fundador do Zoroastrismo. Ele introduziu um sistema dualista no qual o universo era dividido entre o bem, representado por Ahura Mazda, e o mal, representado por Angra Mainyu.[7] Esse dualismo influenciou a filosofia persa e suas concepções de ética, justiça e moralidade.

Durante o Império Aquemênida, figuras como Ciro, o Grande aplicaram princípios zoroastristas em suas políticas, como visto no Cilindro de Ciro, que muitos consideram a primeira declaração de direitos humanos.[8]

Após o domínio dos Aquemênidas, a filosofia persa foi influenciada pelo Helenismo, trazido por Alexandre, o Grande. Durante o período Sassânida, surgiram pensadores como Mani e Mazdak, que introduziram conceitos de justiça social e igualdade.[9]

Filosofia Islâmica Medieval (aproximadamente 700 – 1500 d.C.)

[editar | editar código-fonte]
Ver artigo principal: Filosofia islâmica

A filosofia islâmica floresceu durante o período medieval, particularmente durante o Califado Abássida (750–1258), quando a Casa da Sabedoria, em Bagdá, tornou-se um centro de tradução e estudo de textos gregos, persas e indianos. Filósofos como Al-Farabi, Avicena e Averróis foram profundamente influenciados pela filosofia grega, especialmente as obras de Platão e Aristóteles, e tentaram reconciliar esses ensinamentos com a teologia islâmica.[10]

Avicena desenvolveu a teoria do "ser necessário" (wajib al-wujud), na qual argumentava que Deus era um ser cuja existência era imprescindível para a criação do universo.[11] Esse conceito teve um impacto duradouro tanto na filosofia islâmica quanto na filosofia cristã medieval.

Os principais temas da filosofia islâmica são:

  • Metafísica e Ontologia: O conceito de wajib al-wujud, introduzido por Avicena, foi fundamental para as discussões filosóficas islâmicas sobre a natureza de Deus e do universo.[12]
  • Ética e Política: Al-Farabi discutiu a relação entre religião e governança, propondo uma sociedade ideal baseada na razão e na virtude, influenciado pelos escritos de Platão.[13]
  • Teologia: O desenvolvimento do Kalam (teologia islâmica) buscava reconciliar a fé com a razão, abordando questões filosóficas como a criação do universo e o livre-arbítrio.[14]

Filosofia Contemporânea (século XIX – presente)

[editar | editar código-fonte]

Nos séculos XIX e XX, o pensamento filosófico no Oriente Médio foi moldado pelos desafios do colonialismo e da modernidade. Intelectuais como Jamal al-Din al-Afghani e Muhammad Abduh buscaram modernizar o pensamento islâmico para enfrentar as pressões do imperialismo europeu.[15]

No Irã, pensadores como Ali Shariati combinaram a tradição islâmica com o marxismo, propondo uma revolução social e religiosa.[16]

Referências

  1. Said, Edward. Orientalism. Pantheon Books, 1978. pp. 20-45. ISBN 978-0-394-42815-3.
  2. Allen, James P. Middle Egyptian: An Introduction to the Language and Culture of Hieroglyphs. Cambridge University Press, 2014. pp. 102-106. ISBN 978-1-107-67868-0.
  3. Dickson, Keith. The Epic of Creation: Enuma Elish. Penguin Classics, 2018. ISBN 978-0-14-044950-1.
  4. Roth, Martha T. Law Collections from Mesopotamia and Asia Minor. Scholars Press, 1997. pp. 96-102. ISBN 978-0-7885-0303-0.
  5. Davis, Daniel. The Epic of Gilgamesh. Penguin Classics, 2013. ISBN 978-0-14-044919-8.
  6. Redford, Donald B. The Ancient Gods Speak: A Guide to Egyptian Religion. Oxford University Press, 2002. pp. 43-44. ISBN 978-0-19-521472-9.
  7. Boyce, Mary. Zoroastrians: Their Religious Beliefs and Practices. Routledge, 2001. pp. 33-45. ISBN 978-0-415-23903-0.
  8. Frye, Richard N. The Heritage of Persia. Weidenfeld and Nicolson, 2006. pp. 80-83. ISBN 978-0-297-74456-5.
  9. Pourshariati, Parvaneh. Decline and Fall of the Sasanian Empire. Journal of Persian Studies, 2012. pp. 89-115.
  10. Nuseibeh, Sari. The Oxford Handbook of Islamic Philosophy. Oxford University Press, 2016. pp. 55-65. ISBN 978-0-19-981257-0.
  11. Nasr, Seyyed Hossein. Islamic Philosophy and Its Role in Modern Thought. Harvard University Press, 2006. pp. 87-94. ISBN 978-0-674-02782-2.
  12. Davidson, Herbert. Alfarabi, Avicenna, and Averroes on Intellect. Oxford University Press, 1992. pp. 102-115. ISBN 978-0-19-507423-1.
  13. Black, Deborah. Al-Farabi: An Introduction to Islamic Philosophy. Cambridge University Press, 1995. ISBN 978-0-521-46788-7.
  14. Fakhry, Majid. A History of Islamic Philosophy. Columbia University Press, 1983. ISBN 978-0-231-07812-0.
  15. Hourani, Albert. Arabic Thought in the Liberal Age. Cambridge University Press, 1983. pp. 112-150. ISBN 978-0-521-29166-6.
  16. Rahnema, Ali. An Islamic Utopian: A Political Biography of Ali Shariati. I.B.Tauris, 1998. pp. 97-108. ISBN 978-1-86064-552-5.