Jésus-Christ en Flandre | |||||||
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Autor(es) | Honoré de Balzac | ||||||
Idioma | Francês | ||||||
País | França | ||||||
Série | Études philosophiques | ||||||
Editora | Furne | ||||||
Lançamento | 1846 | ||||||
Cronologia | |||||||
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Jésus-Christ en Flandre (em português, Jesus Cristo em Flandres[1]) é uma novela de Honoré de Balzac. Provavelmente redigida em 1830, datada de 1831, revista e remanejada um grande número de vezes, foi pensada para ser o “peristilo dos estudos filosóficos”, de acordo com um prefácio do Livre mystique, redigido pelo autor em 1835.[2]
Sua publicação definitiva acontece em 1846 nos Estudos filosóficos da edição Furne da Comédia Humana. Entre essas duas datas, o texto foi publicado na edição Gosselin de 1831, nos Romances e contos filosóficos, depois nos Contos filosóficos no ano seguinte, pelo mesmo editor. Em 1836, uma versão drasticamente revisada foi publicada por Werdet em duas partes sob o título de L’Église (A Igreja) e L’Hallucination (A Alucinação). Uma parte do texto intitulada Zéro foi publicada em 1830 em La Silhouette, na qual Balzac assinava sob o pseudônimo de Alcofibras.
A novela é dedicada a Marceline Desbordes-Valmore, que uma amizade e uma admiração (recíprocas) ligavam ao romancista.[3] A poetisa era originária de Douai, vila na qual Balzac situa La Recherche de l'absolu.
A ação se desenrola, de acordo com o autor, “em uma época indeterminada”, que dá à parábola religiosa um valor atemporal.
Na barca de transporte que liga a ilha de Cadzant (hoje desaparecida, mas que existia no século XVIII) com as costas de Flandres Ocidental perto de Oostende, os notáveis se sentam na parte de trás do barco e os pobres na da frente. Quando surge um desconhecido, os notáveis não fazem nada para deixar-lhe um lugar entre eles, enquanto os pobres se apertam (um deles senta até mesmo na borda do barco para deixar-lhe um assento). O céu está ameaçador, o mar está tempestuoso, o próprio barqueiro sente que haverá uma tempestade
O quadro descrito por Balzac relembra as mais belas cenas da pintura de gênero flamenga, que ele chamava também de pintura holandesa, de que era grande admirador[4] · [5] · .[6] À medida que o barco avança e que a tempestade chega, descobre-se que o estranho chegado ao barco, apesar de suas vestimentas, não é um pobre. É um ser à parte: Jesus Cristo, como indica o título; ele salvará os justos que encontrar no meio dos humildes no momento do naufrágio.
A segunda parte da novela se desenvolve na capela que construíram no lugar onde se produziu o milagre. O narrador da lenda é presa de uma alucinação: uma mulher velha (personagem já apresentada em Zéro, que encarna uma Igreja desgastada pelos comprometimentos) é transfigurada em uma bela jovem (a Igreja pode reencontrar seu brilho).
Honoré de Balzac dá um grande espaço a Flandres em sua narrativa, escrevendo na dedicatória a Marceline Desbordes-Valmore: “A vós, filha da Flandres, que sois uma das glórias modernas, essa ingênua tradição das Flandres”.
No começo do texto, Flandres é situada em um período indeterminado, mas ele faz também referência à Flandres de Brabante: “A uma época muito indeterminada da história de Brabante, as ligações entre a ilha de Cadzant e as costas de Flandres eram mantidas por uma barca destinada à passagem dos viajantes. A capital da ilha, Middelbourg, mais tarde tão célebre nos anais do protestantismo, incluía apenas duas ou três centenas de famílias. A rica Oostende era um porto desconhecido (…) Quem reinava então em Brabante, em Flandres, na Bélgica? Sobre esse ponto, a tradição se cala.[7]».”
Poder-se-ia considerar essa novela como uma “narrativa edificante”, se não contivesse toda a reunião de contradições religiosas do autor.
Em um espírito voltairiano, quase anticlerical, este católico, que proclamará mais tarde que a sociedade é fundada sobre dois princípios indiscutíveis, a Igreja e a monarquia, ataca violentamente a religião que, por ter se tornado cúmplice dos notáveis e ter esquecido os humildes, não é mais que um cadáver em suspenso.[8]
Mas, antítese, mesmo quando a Igreja se engana, ela continua capaz de manter seu brilho divino. Assim, o julgamento evangélico guarda sua virtude.
Em fevereiro de 1831, uma greve em Paris saqueou a igreja de Saint-Germain l'Auxerrois, e o arcebispado. Balzac, perturbado por esse surto de violência, principiou então sua evolução espiritual.[9] É preciso encarar com prudência esta hipótese: outras foram propostas, notadamente a de que ele buscava se reconciliar com a Igreja porque seu catolicismo pouco ortodoxo poderia atrair os "raios" eclesiásticos (que ele atraiu, de todo modo).