Chimané tsinsi' mik / khaei’si’ mik | ||
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Outros nomes: | Tsimane, Tsimané e Chimane | |
Falado(a) em: | Bolívia | |
Região: | San Borja e Rio Maniqui | |
Total de falantes: | 4000 - 8000 | |
Família: | Línguas Mosetenas Chimané | |
Escrita: | Alfabeto latino (Variante chimané) | |
Estatuto oficial | ||
Língua oficial de: | Bolívia | |
Regulado por: | Artigo 5° da Constituição Política do Estado | |
Códigos de língua | ||
ISO 639-1: | --
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ISO 639-2: | --- | |
ISO 639-3: | cas
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A língua chimané (tsinsi' mik ou khaei'si' mik),[1] também conhecida como tsimane, tsimané ou chimane,[2] é uma das línguas oficiais do Estado Plurinacional da Bolívia e faz parte da pequena Família Linguística Mosetena,[3] a qual conecta, além do chimané, o mosetén e seus dois dialetos: mosetén de Santa Ana e mosetén de Covendo.[3][4] O chimané é falado pelo povo chimané (ou tsimane'), o qual habita, majoritariamente, a região da Cidade de San Borja, localizada no Departamento de Beni, e intermediação do Rio Maniqui, próximo à cidade.[5][6] O tsimané é uma das poucas línguas originárias da Bolívia cujo número de falantes, atualmente de 4 a 8 mil nativos,[7][8][9] está em índice de crescimento,[7] fruto de uma cultura monolinguísta entre o povo chimané.[4][10] Apesar disso, ainda é classificada como "Vulnerável" pela UNESCO,[11] realidade adversa em relação às outras línguas da família mosetena, classificadas como "Severamente em Risco".[9]
As construções tsinsi' mik e khaei'si' mik, endônimos da língua chimané para se referir à própria língua, traduzidos, respectivamente, como 'nossa língua' e 'língua de um só' em português.[1] A partícula tsinsi', em chimané, funciona como pronome possessivo 'nosso/nossa',[12] assim como a partícula khaei', a qual pode ser um pronome possessivo[13] que, unido ao sufixo pronominal feminino -si',[14] atribui a posse do substantivo mik, o qual apresenta significado de língua, idioma ou fala.[15][16]
As diversas maneiras de se referir à língua chimané, sendo eles tsimane, tsimané e chimané, advêm de uma mesma explicação histórica: representar a forma com que os falantes e povo são reconhecidos. A introdução do termo 'chimané' ocorreu, de forma documental, durante as Missões Jesuíticas na América no ano de 1621, fato marcante na história tsimané. O missionário franciscano Gregório de Bolívar se referiu aos falantes como indígenas 'chumanos' [17] e, a partir dessa documentação, a nomenclatura foi se alterando nos demais registros até concretizar-se no modo com que nos referenciamos atualmente. Já o termo 'tsimane' tem uma relação direta com o endônimo, sendo ele uma forma ocidentalizada de representar o modo originário de se referir à língua com base nas formas alternativas tsinsisi ou tsinsis.[1]
Os falantes chimanés, compostos predominantemente por nativos, se concentram na região plana do Departamento de Beni, permeando a cidade de San Borja e rios próximos, como o Rio Beni e Maniqui, vivendo em comunidades nas áreas de reserva e terras comunitárias indígenas, a exemplo da Comunidade de Associação de Quiquibey[18] e Pilón Lajas, reserva ecológica e corredor ecológico localizada no departamento de La Paz.[19] Existem, além dos nativos de San Borja, falantes presentes nos municípios de San Ignacio de Moxos, Rurrenabaque e Santa Ana de Yacuma, todos no Departamento de Beni.[18] A concentração geográfica, diferente das demais línguas mosetenas, é resultado da vegetação local, a qual, por ser uma planície pantanosa, gerou dificuldade para a chegada de Missões Jesuítas na região e a possível evasão espacial.[20]
O chimané, por muito tempo, foi considerado um dialeto da língua mosetén, junto do mosetén de Santa Ana e mosetén de Covendo, por apresentar uma próxima similaridade fonética e vocabular, apenas se distanciando no campo gramatical.[4] Entretanto, atualmente pode-se considerar o chimané e mosetén como duas línguas distintas de uma mesma família linguística,[21] composta por dois principais dialetos, tornando o chimané uma língua sem variações, mas com uma inteligibilidade ao comparar-se com suas línguas relacionadas, principalmente com o mosetén de Santa Ana.[21]
O ponto-chave para a classificação do chimané como uma língua própria foi, além dos estudos linguísticos, o parâmetro antropológico e histórico. Os chimanés e moseténs se consideram, por razões religiosas e culturais, povos distintos que não disfrutam da mesma língua, mas, da mesma forma, ambos reconhecem a similaridade antiga existente e se chamam de chaetidye' (em português, 'pessoas emparentadas').[21]
Ao se tratar da família mosetena, o consenso a classifica como americana, mas isolada das demais famílias latinas pela sua singularidade gramatical.[22] Porém, no decorrer da história, alguns linguistas e historiadores já tentaram sugerir alternativas de famílias para associar ás línguas mosetenas.[1] Cronologicamente, o Swadesh (1960) associou a família mosetena ao Macro-Quechua, mas, posteriormente (1963), configurou-a à família Mosetén-Chonan, afirmando que exista cerca de 34% do léxico de ambas famílias compartilhados.[23][24] Suárez (1973) considerou válida, mas superficial, a relação com o Chon, associando o Yuracare ao Chon e mosetén, mas a agrupou, sobretudo, com as línguas Paco-Tacananas a partir de uma lista de possíveis cognatos que compartilham.[22] Em 1977, Suárez atualizou o agrupamento moseteno e identificou uma possível relação com o Uru (Uchumataqu, língua perdida do povo Uru) e Amuesha (ou Yanesha') advinda de uma lista de palavras presentes nas línguas.[22] Já na raiz genética, o povo chimané tem ligação direta com os quíchuas pelo DNA Mitocondrial. No entanto, apesar de não serem línguas diretamente agrupadas, classificações gramaticais chimanés, como a primeira pessoa do plural, receberam provável influência quíchua.[22]
O chimané e mosetén, apesar de serem línguas estreitas na família mosetena, apresentam, dentre as características linguísticas, divergências gramaticais, fonéticas, vocabulares e ortográficas.[4]
Mosetén | Chimané | |
---|---|---|
Língua | nem | nem |
Dente | moñin | modyin |
Mão | uñ | unya' |
Água | oxñi | ojñi' |
Fogo | tsi | tśij |
Lua | ivua | ivaj |
Casa | aka | aca' |
Mulher | pen | ṕen |
Jaguar | itsiki | ítsiquí |
Milho | tára | tára |
Um | irit | yiri' |
Dois | pára | pärä |
Três | chibin | chibin |
A língua chimané, ao decorrer do tempo, pouco sofreu alterações, seja pela falta de dialetos, seja pela de empréstimos linguísticos de colonizadores ou tribos vizinhas.[20] Essa realidade reflete a característica territorial e cultural do povo tsimané, de tal forma que, por localizarem-se num ambiente plano, pantanoso e isolado, poucas Missões Jesuítas puderam se instalar concretamente na área de habitação chimané.[20] Fato que, aliado às origens guerrilheiras, religiosas e isolada, propiciou uma menor corrente variante da língua e povo.[20] Questões totalmente divergentes quanto a língua mosetén, que, por estarem localizadas predominantemente nas terras altas bolivianas, receberam forte influência do espanhol por quase 200 anos e de línguas vizinhas na formação linguística moderna.[20]
Apenas em 1693, mais especificamente no dia 10 de Outubro, com a fundação da Missão de San Borja pelos jesuítas Francisco de Borja e Ignacio Sotomayor, os chimanés puderam ter desenvolvido um contato com a língua europeia e vizinhas, já que, nessa missão, os jesuítas incluíram na mesma região moseténs, tsimanés, moxos e até movimas.[26] Após o fim da missão os demais povos se distribuíram pelas terras bolivianas e os chimanés permaneceram, circundando as terras de San Borja até os dias de hoje, sendo reconhecidos, especialmente, pelas suas túnicas de algodão brancas.[6]
O primeiro registro sobre o povo chimané é datado de 1621 pelo franciscano Gregório de Bolívar, o qual referiu-se a eles como índigenas 'chumanos'.[17] Devido ao demorado processo de distinção do mosetén e chimané, a grande parte dos materiais linguísticos chimanés apenas irão aparecer, após um salto temporal de quase 360 anos, em 1978 pelo alemão Jurgen Riester, o qual registrou canções e histórias na língua.[27] No início dos anos 80, Wayne Gill, protestante norte americano, participou da Missão Evangélica Novas Tribos, organização voltada para o contato com línguas e povos que não disfrutam de uma tradução da bíblia, mantendo contato, prestando suporte e conhecendo a língua nativa.[27] Gill aprendeu o chimané, traduziu o Novo Testamento e partes do Antigo e desenvolveu uma proposta de sistema de escrita para a língua, a qual foi aceita pela comunidade tsimané.[27] Além do sistema de escrita, Gill produziu um dicionário chimané-Espanhol, um chimané-Inglês, que, em 1999, apreciava mais de 5000 palavras, e um manuscrito "Teach-yourself-chimané" para auxiliar os demais missionários na região, contendo informações gramaticais, frases triviais e religiosas.[27][4] De 1987 até 1994, com o auxílio de Perez Dies entre 1989 e 1990, a argentina Eusebia H. Martin desenvolveu algumas notas linguísticas sobre o chimané.[28]
As documentações mais recentes se baseiam em dois autores: Gran Consejo Tsimane' e Jeanette Sakel. O conselho chimané produz, desde de 1999, livretos culturais e linguísticos acerca do chimané, tornando os materiais atualizados e vivos, seja em ambiente virtual, seja em físico.[28][22] Jeanette Sakel, linguista britânica, produz, desde 2003, a partir de sua tese de doutorado, materiais gramáticos e históricos torneando a língua chimané, como de exemplo o livro "A Grammar of Mosetén", o qual destrincha parte da cultura, gramática, fonologia e ortografia da família mosetena.[29]
No geral, o campo de pesquisa do chimané se baseia em dois grupos de fonte primária, sendo eles de exploradores e viajantes, os quais passaram pela região e registraram listas de palavras, textos e materiais relacionados, e missionários, os quais conviveram com o povo e traduziram termos e produziram materiais gramaticais descritivos.[17]
A língua chimané, sendo uma das poucas línguas originárias com um índice de crescimento no número de falantes,[7] apresenta práticas que preservam, tanto a cultura quanto o ensinamento da língua para as futuras gerações. O estudo educacional do chimané iniciou-se, formalmente, a partir da introdução do sistema de escrita proposto por Gill em 1988, em escolas destinadas ao ensino integral da língua chimané às demais gerações.[30] A conduta aplicada às escolas é responsável pela maior adoção do monolinguísmo,[30] além dos idosos, pela população jovem que, devido ao maior contato do povo tsimané com turistas, agentes governamentais e cidadãos externos, tem sido influenciada também pelo castelhano.[30] A realidade chimané atual compreende mais de 30 escolas,[20] geridas pelo Gran Consejo Tsimane' e pela Missão Evangélica Novas Tribos,[30] dedicadas ao o ensino da língua para a comunidade local, além de materiais informativos produzidos pelo conselho tsimané, organização composta por membros nativos chimanés para a produção educacional e cultural do povo, a exemplo do livreto "Aprenda Tsimane'", disponível virtualmente.[28]
Além da questão escolar, as questões culturais também proporcionam o uso ativo da língua no dia-a-dia e estão marcadas na vivência chimané. Um exemplo aplicado da cultural tradicional chimané é a utilização de máscaras esculpidas em madeira, normalmente de balsa ou cedro e pintadas de preto (carvão vegetal) e violeta, nas cerimônias e festejos.[31] As máscaras representam, em sua maioria, o espírito das matas e florestas, Opo, mas podem representar igualmente diversos animais, como onça, porco do mato e diversas aves com a utilização de dentes dos animais incrustados nas máscaras em destaque e o significado especial atribuído pela cultura às orelhas presentes no sentido de ouvi-las.[31] A utilização das máscaras acontece após uma boa caçada numa cerimônia marcada por dança e encenação, assim como pode ser utilizada pelos chimanés mais velhos de modo espiritual e privado.[31] As pinturas são, além do uso nas máscaras, presentes em outras situações do cotidiano chimané, como em canoas, vestuário, bonecas e na arte rupestre.[32]
A fonologia do chimané é composta por 6 pares fonéticos vocálicos e 24 fonemas consonantais sem apresentar tons. A construção de esquemas consonantais e vocálicos, assim como na estrutura silábica, se assemelha com as línguas latinas, a exemplo do uso de bases mínimas para a inclusão vocálica e a estrutura de sílabas (C)V(C).[33]
Os inventário de fonemas consonantais chimané não apresenta variações. Sendo os fonemas p, t, tʲ (escrito como ty), k (escrito como c ou qu), pʰ (escrito como ṕ), kʰ (escrito como ć ou q́u), b, d, dʲ (escrito como dy), f, s, ʃ (escritos como sh), x (escrito como j), h (escrito como j), ts, tʃ (escritos como ćh), tsʰ (escrito como tś), tʃʰ (escrito como ch), m, n (escrito como n ou n'), ɲ (escrito como ñ), r e as aproximantes ʋ (escrita como v) e j (escrita como y). Além dessas, outras duas consoantes l e g existem, mas apenas em casos de empréstimos linguísticos e nomes do espanhol, logo, não fazem parte do inventário chimané.[34]
Bilabial / Labiodental | Dental-alveolar | Palatal | Velar | Glotal | ||
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Oclusiva | Desvozeada | p | t, tʲ | k | ʔ | |
Desvozeada aspirada | pʰ | kʰ | ||||
Vozeada | b | d, dʲ | ||||
Fricativa | f | s | ʃ | x | h | |
Africada | ts | tʃ | ||||
Africada aspirada | tsʰ | tʃʰ | ||||
Nasal | m | n | ɲ | |||
Vibrante | r | |||||
Aproximante | ʋ | j |
Características especiais são a palatalização e aspiração, presentes nos exemplos[34]:
Todas as consoantes podem aparecer no início e fim de sílabas.[35]
É um fenômeno à parte dos demais pois, além de fazer parte da estrutura silábica chimané, aparece apenas no final das sílabas.[36]
A oclusiva glotal /ʔ/ poderá aparecerá fora do final silábico apenas caso esteja acompanhada das consoantes nasais /m/, /n/ ou da vibrante /r/.[36]
A plosiva /d/ tem uma aparição rara na construção silábica chimané, visto que apenas ocorre acompanhado das vogais /ɘ/ ou /ɘ̃/ que estão seguidas das consoantes /r/, /x/, /ʔ/ ou numa sílaba (C)V.[37]
As fricativas apresentam apenas um caso especial formado pelo fonema /h/, constituído pela fricativa velar [x] e uvular [h]. De forma que apareça [h] apenas em casos de início de sílaba e [x] em casos de final de sílaba.[38]
As vogais chimanés são separadas em pares, sendo, ao todo, 6 pares vocálicos, cada um dividido entre as vogais orais e nasais.[39]
Anterior | Central | Posterior | |
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Fechada | i / ĩ | ɨ / ɨ̃ | |
Semifechada | e / ẽ | o / õ | |
Média | ə / ə̃ | ||
Aberta | a / ã |
O chimané tem 6 vogáis orais, sendo elas i (com o alófono ɪ), e, a, ə, ɨ, o (com os alófonos u / ɔ), além das 6 vogais nasais ã, õ, ə̃, ɨ̃, ĩ, ẽ. Todas podem ser geralmente vistas em todos os tipos de sistemas silábicos V, (C)V, V(C) e (C)V(C) (C = consoante / V = vogal) como também com seus contrastes fonéticos.[40]
/i/ é uma vogal com dois alófonos, [i] e [ɪ]. Ambas aparecem nas construções fonéticas, mas com uma diferença de comprimento vocálico. Na forma básica [i] e [ɪ] existem, mas na forma longa, apenas existe [ii]. O uso de [ɪ] é, de certa forma, incomum pela sua aparição apenas precedendo fricativas ou africadas.[41]
/ĩ/ é uma variação nasal separada do fonema /i/. O fonema, assim como /i/, apresenta variação de comprimento similar. Sendo na forma longa /ĩĩ/ e na forma básica /ĩ/, não existindo o alófono [ɪ̃] na forma básica.[42]
/o/ é uma vogal com três alófonos, [o], [u] e [ɔ]. Na maioria dos casos, o uso será composto pelo alófono [o]. O [u] será utilizado em alguns casos específicos, como em 'na montanha' [ruktʃeʔ]. Já o [ɔ] será composto apenas quando /o/ for acompanhado de uma fricativa na mesma sílaba.[43]
/õ/ é uma variação nasal separada do fonema /o/. Apresenta, inclusive, os mesmos alófonos, mas na forma nasal [õ], [ũ] e [ɔ̃]. Assim como na forma oral, o [ũ] será raro de se encontrar nos esquemas vocabulares. O [ɔ̃] também sofrerá as mesmas configurações de sua forma oral, mas apenas se a sílaba consonantal final for fricativa.[44]
/ɨ/ é uma vogal central fechada oral não arredondada presente apenas no chimané e mosetén de Santa Ana, substituindo os fonemas /i/ e /ə/, assim como sua forma nasal /ɨ̃/.[45]
Existem ditongos na fonologia chimané e são utilizadas as semivogais/aproximantes /j/ e /ʋ/ em coda silábica. Podendo associar-se a todos os pares vocálicos tanto na forma oral quanto nasal. Não existe outra forma de ditongo sem utilizar as aproximantes.[46]
A estrutura silábica padrão do chimané é composta pela sequência (C)V(C)(ʔ), ou seja, vogal seguida ou precedida por consoantes com uma glotal final. A estrutura pode ser alterada pela ação de dois fenômenos: a assimilação vocálica e a harmonia nasal.[47]
A assimilação vocálica é um processo que, pela escolha de sufixos, altera as vogais presentes nas construções verbais. A assimilação acontece, principalmente, em verbos com marcas verbais inflexíveis, como as marcas -ti- (nós em forma de sujeito) e -sin' (nós em forma de objeto). As marcas -ti- e -sin' transformam as vogais presentes em /i/. Nem todas as marcas tem função de assimilação vocálica, como -te (objeto indefinido).[47]
Existe, no entanto, um caso especial para a assimilação vocálica. Caso o verbo contenha a vogal /i/ em sua formação, a vogal será substituida por /ä/ como prioridade.[47]
Existem marcas além das direcionadas à 1° Pessoa do Plural, como as direcionadas para a 1° e 2° Pessoa do Singular -ti' e -n, que significam, respectivamente, 'você atua em mim' e 'alguém atua em mim, você e nós'. Porém, são menos aplicadas no dia-a-dia chimané.[47]
A harmonia nasal é um processo que ocorre na presença de uma vogal nasal na formação das palavras, alterando a cadência dos demais sufixos ou prefixos adicionados à palavra central. De forma que, caso uma palavra seja ou esteja composta por vogais nasais, todos os demais afixos adicionados deverão corresponder ao formato.[47]
Além da palavra ser composta por vogais nasais, existem, na harmonia nasal, consoantes nos afixos com função bloqueadora. Sendo elas /t/, /ty/, /c/, /qu/, /ć/, /q́u/, /b/ e /dy/, de forma que barrem a regra e a cadência não seja assimilada pelos afixos.[48]
A harmonia nasal e a assimilação vocálica, por vezes, podem acabar chocando-se na construção de verbos e palavras. Na ocorrência do caso, a assimilação vocálica é admitida como prioridade e transforma as vogais nasais em orais além da transformação da primeira vogal em /i/.[49]
A tonicidade e acentuação das palavras chimanés é feita e considerada de uma forma bastante simples. O uso do acento agudo, pontuando a tonicidade das sílabas, é utilizado, geralmente, na primeira sílaba das palavras e, caso sejam uma palavra extensa, aplicada também na terceira sílaba.[50]
Existem uma variação quanto ao uso de prefixo nos verbos e nomes, o qual pontuará a primeira sílaba após o sufixo.[50]
Além do uso padronizado da primeira e terceira sílaba, algumas palavras chimanés apresentam um padrão próprio, podendo pontuar sílabas divergentes do costume.[51]
E, por fim, ao utilizar sufixos nas palavras, é preservado o padrão de pontuação ou da palavra pré-sufixo.[52]
Em toda a história chimané, foram propostos, por Wayne Gill e Colette Grinevald, dois sistemas de escrita para o povo tsimané. Cronologicamente, Gill desenvolveu, no início dos anos 80, um sistema de escrita baseado na ortografia espanhola para o povo chimané, mas adaptado pelo chimané para conter sons que não existem no espanhol, como as vogais nasais e consoantes aspiradas e palatalizadas.[53] A recepção desse sistema de escrita foi deferido pela comunidade chimané e, até os dias de hoje, é adotado nas escolas chimanés.[54]
O sistema de escrita desenvolvido pela linguista francesa Colette Grinevald, em 1996, como parte de um projeto da linguista para, após o estudo das línguas da região, incluindo o chimané e mosetén, produzir um alfabeto comum a todas as línguas bolivianas das terras baixas.[54] Grinevald optou por não adaptar o alfabeto espanhol no desenvolvimento de seu sistema de escrita e, após concluir seu projeto, propôs um alfabeto único para a família mosetena. Os moseténs, juntamente com os falantes dos dialetos de mosetén de Santa Ana e Covendo, optaram pelo alfabeto de Grinevald, enquanto os chimanés optaram pelo sistema de Gill por já terem jovens alfabetizados nesse alfabeto à época e não se sentirem representados pela unificação proposta por Grinevald.[54][55]
O alfabeto chimané é composto por 40 letras, sendo 29 consoantes e 6 pares vocálicos, ou 12 vogais. As vogais e consoantes que não estão presentes no espanhol, vogais nasais e consoantes aspiradas/palatilizadas, são marcadas com diacríticos. Os fonemas vocálicos /ɨ/ e /ɘ/, assim como suas formas nasais, estão representados, respectivamente, pelas letras /u/ e /ä/. Não são indicadas acentuações no alfabeto de Gill, apenas nas composições de palavras (ou morfemas) e distinção de ambiguidade.[56]
Letra | Fonema | Aproximação no Português |
---|---|---|
p | /p/ | Peixe |
t | /t/ | Montanha |
ty | /tʲ/ | Grátis |
c / qu | /k/ | Cor |
' | /ʔ/ | Oh-oh (comprimento silábico) |
ṕ | /pʰ/ | Pack (em inglês) |
ć / q́u | /kʰ/ | Kiss (em inglês) |
b | /b/ | Banco |
d | /d/ | Dar |
dy | /dʲ/ | Rádio |
f | /f/ | Feira |
s | /s/ | Sabiá |
sh | /ʃ/ | Cacho |
j | /x/ | Arrasto |
j | /h/ | Carro |
ts | /ts/ | Participação |
ćh | /tʃ/ | Presente |
tś | /tsʰ/ | Democratizar (pronúncia cortando o /i/) |
ch | /tʃʰ/ | Sem correspondência |
m / m' | /m/ | Molengo |
n / n' | /n/ | Norte |
ñ | /ɲ/ | Manhã |
r | /r/ | Buraco |
v | /ʋ/ | Verdade |
y | /j/ | Raio |
Letra | Fonema | Aproximação no Português |
---|---|---|
i | /i/ | Hiato |
į | /ĩ/ | Indígena |
e | /e/ | Mesa |
ę | /ẽ/ | Venha |
a | /a/ | Casa |
ą | /ã/ | Encantamento |
ä | /ə/ | Duh (interjeição) |
ą̈ | /ə̃/ | Hangar |
u | /ɨ/ | Alaúde |
ų | /ɨ̃/ | Round (em inglês) |
o | /o/ | Dois |
ǫ | /õ/ | Dispõe |
A gramática chimané é composta por alguns empréstimos do espanhol e outras línguas na sua composição. As classes gramaticais chimanés são definidas e diretas e tem o uso de clíticos, reduplicação e afixos como características predominantes.[57][56]
O chimané apresenta pronomes pessoais, possessivos, demonstrativos, interrogativos, indefinidos, reflexivos e recíprocos em seu sistema morfológico. Apresentando morfemas expressivos delimitando sentido e o recorrente processo de termos cliticizados em todas as classificações de pronomes.[58]
O chimané apresenta 8 pronomes pessoais, sendo eles 4 singulares e 4 plurais subdivididos em três pessoas, característica similar ao português.[59]
Chimané | Português | |
---|---|---|
1° Pessoa SG | yu | eu |
2° Pessoa SG | mi | tu / você |
3° Pessoa SG (M) | mu' | ele |
3° Pessoa SG (F) | mo' | ela |
1° Pessoa PL | tsun | nós |
2° Pessoa PL | mi'in | vós / vocês |
3° Pessoa PL (M) | mu'in | eles |
3° Pessoa PL (F) | mo'in | elas |
Os pronomes pessoais podem ser utilizados também para classificar verbos na forma de sufixo. É utilizado um único pronome, seja da 1° ou 2° pessoa, nos verbos normalmente, mesmo como sujeito ou objeto da sentença.[59]
O chimané apresenta dois pronomes demonstrativos, um para cada gênero, utilizados sozinhos ou acompanhados a algum termo adverbial normalmente de forma prefixal.[59]
Chimané | Português | |
---|---|---|
Feminino | ǫi | esta |
Masculino | uts | este |
A utilização pode ser direta ou acompanhada.[59]
A morfologia chimané não apresenta pronomes possessivos enquanto partículas específicas, mas utilizam os pronomes pessoais vinculando substantivos e marcadores expressivos à semântica de posse.[59]
O uso dos marcadores sufixais de gênero se dividem em dois casos. A primeira é válida para o uso nos pronomes pessoais que terminem em vogal, yu e mi, sendo eles -ty (masculino) e -s (feminino). O segundo caso é válido para os pronomes pessoais que não terminam com vogal, sendo eles -tyi (masculino) e -si (feminino). Ambos marcadores podem preceder a classificação de um substantivo que apareça posteriormente além da função de qualificar o pronome.[59]{{HarvRef|Gill|1999|p=2}
Os pronomes interrogativos chimané são baseados em uma única partícula: ju(n') - 'como'. As diferentes formas de se utilizar o pronome interrogativo são associando à partícula ju(n') de modo direto ou indireto aos demais termos ou clíticos existentes na gramática chimané, com exceção das partículas tyi/si - 'quem' e a jedye - 'o que'.[60]
Chimané | Português | |
---|---|---|
Plural (M) | jun'tyi | quantos |
Plural (F) | jun'si | quantas |
Singular | jun'chę | quanto |
Singular | jun'qui | qual o tamanho / quanto |
Plural Inclusivo | jun'tom | quantos |
Singular (M) | ju'ñity | qual |
Singular (F) | ju'ñis | qual |
Chimané | Português |
---|---|
jun'ją | vejamos se |
jun'acbą | como poderia ser / como pode |
Os pronomes interrogativos são indicados preferencialmente no início das sentenças assim como nas demais línguas latinas.
A gramática chimané apresenta os pronomes indefinidos como uma única partícula, o ćuį'. A partícula indefinida aparece normalmente no final de termos nominais para formas pronomes indefinidos.[60]
Os pronomes negativos são adicionados precedendo os elementos pronominais de forma excepcional. A gramática chimané apresenta um único elemento pronominal, o jam.[60]
Os pronomes reflexivos chimanés são divididos em duas vertentes: -ti (singular e plural) / -tića' (1° pessoa do plural) e ćuį'. Os elementos reflexivos são adicionados para dar ênfase em frases além da função semântica.[61][60]
Os pronomes recíprocos chimanés têm como suas duas partículas pronominais o -ti (singular e plural) e o -tića' (1° pessoa do plural). São inseridos normalmente ao final dos elementos para construção de sentido.[61]
Os substantivos no chimané são utilizados nas sentenças nominais como núcleo da frase. O substantivo pode aparecer usualmente em sua forma padrão ou adicionado por marcadores como sufixos e prefixos que alteram as propriedades daquele substantivo. Os marcadores podem ser de gênero, número, posse, nominalização e grau.[62]
Os marcadores de gênero no campo de substantivos funcionam como acessórios ao substantivo em forma de prefixo, anexados ao substantivo, pronomes, verbos e advérbios precedidos. Os principais marcadores são o -tyi' e -si, sendo eles o marcador masculino e feminino respectivamente.[63]
Podem ser utilizados pronomes possessivos em verbos precedidos para marcar o gênero do substantivo antecipadamente. O chimané apresentava gênero misto antes do contato com o espanhol e ter recebido empréstimos linguísticos, o qual é utilizado até hoje como o pronome pessoal feminino mo'in - 'elas'. A única exceção presente no chimané para a marcação de gênero está presente nas palavras soñi - 'homem' e ṕen - 'mulher'.[63][64]
Os marcadores de número existentes no chimané podem ser admitidos de três formas diferentes para distinguir o plural do singular. A primeira forma de distinção é feita através do clítico -in, adicionado ao final dos substantivos para atribuir sentido plural.[65]
A segunda maneira de atribuir o plural a um substantivo ocorre através de um processo de reduplicação nominal, ou seja, o anexo do mesmo substantivo em forma de clítico. A reduplicação causa um efeito concreto de pluralidade ao substantivo analisado na construção frasal.[64]
A terceira forma de atribuir o sentido plural é precedendo um numeral ao substantivo. No entanto, caso o plural não seja o foco da construção nominal o substantivo não contrai para sua forma plural, preservando o singular e subentendendo o sentido.[64]
Os marcadores de posse existentes no chimané são baseados em duas partículas de gênero: -tyi' e -si. As partículas são adicionadas unidas a nomes que estão precedendo substantivos a fim de atribuir o sentido de posse aos sujeitos. O uso do -tyi' é aplicado a substantivos masculinos finalizados em consoante, já o -ty aos finalizados em vogal. O uso do -si ocorre em substantivos femininos finalizados em consoante, já o -s nos finalizados em vogal.[63]
O processo de nominalização ocorre através da partícula específica -dye', a qual tem a função de converter verbos intransitivos em nomes, e das partículas de gênero -tyi' e -si a fim de designar gênero à palavra nominalizada.[66]
Os marcadores de grau no chimané, ou seja, a classificação entre aumentativo e diminutivo, são caracterizados de diferentes formas para cada grau. A atribuição de sentido é considerada pela alteração das vogais presentes no substantivo de orais para nasais ou alteração de vogais no diminutivo.[67]
O aumentativo na língua é marcado pela presença do prefixo chi-' - 'grande' anexado aos substantivos para atribuir o sentido.[67]
As partículas associadas são acessórios anexados aos substantivos para adicionar valor de lugar às sentenças nominais em forma de clíticos ao final dos nomes.[57]
Chimané | Português |
---|---|
-ya' | em, cerca de, em frente |
-ćan | em, baixo |
-ve | rio abaixo, detrás, ao outro lado |
-che' | em, em cima, acima, rio acima |
-mun | entre, com |
-vun | apenas falta um |
Os verbos são marcados por processos únicos e distintos das demais classes gramaticais, sendo caracterizados pela referência cruzada e marcas de derivações verbais. Os verbos são classificados em duas categorias: transitivos e intransitivos. Podem receber marcadores verbais para garantir sentidos diversos ao verbo, como a questão temporal, além das duas classificações.[68][69][70]
Essa tecnologia adotada na gramática chimané é utilizada para se realizar a ligação requisitada entre o sujeito e o objeto nos verbos transitivos e intransitivos. As ligações funcionam através de partículas específicas com foco no gênero e pronome pessoal em questão do agente verbal e objeto.[68]
Verbos Intransitivos
Os verbos são referenciados apenas pelo marcador de gênero e pessoalidade do sujeito por serem marcados pela ausência de objeto. O verbo em questão na tabela é carijtyaqui - 'trabalhar'.[68]
Sujeito Masculino | Sujeito Feminino | |
---|---|---|
1° SG | carijtyaqui | carijtyaqui' |
2° SG | carijtyaqui | carijtyaqui' |
3° SG | carijtyaqui | carijtyaqui' |
1° PE | carijtyaqui | carijtyaqui |
1° PI | carijtyaquija' | carijtyaquija' |
2° PL | carijtyaqui | carijtyaqui' |
3° PL | carijtyaqui | carijtyaqui' |
As alterações são descritas desta forma[68]:
A 1° Pessoa do Plural Inclusivo apresenta uma postura distinta nos campos gramaticais por ter sido um provável empréstimo linguístico.[68]
Verbos Transitivos
Os verbos transitivos utilizam a referência cruzada por pedirem objeto, criando a ligação entre sujeito e objeto a partir pronomes pessoais e gênero por meio de um sufixo para ser anexado aos verbos em todas as ligações.[68]
Objeto Sujeito
|
1° Pessoa Singular | 2° Pessoa Singular | 3° Pessoa Singular (M) | 3° Pessoa Singular (F) | 1° Pessoa Plural Exclusivo | 1° Pessoa Plural Inclusivo | 2° Pessoa Plural | 3° Pessoa Plural |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
1° Singular | -ye | -te | -e' / -i' | -yac | -csi / -csi' | |||
2° Singular | -ti' | -te | -e' / -i' | -tića' | -csi / -csi' | |||
3° Singular | -in | -in | -te | -e' / -i' | -in | -sin' | -nac | -csi / -csi' |
1° Plural Exclusivo | -yac | -te | -e' / -i' | -yac | -csi / -csi' | |||
1° Plural Inclusivo | -ja | -ja' | -cse-ja' | |||||
2° Plural | -tića' | -te | -e' / -i' | -tića' | -csi / -csi' | |||
3° Plural | -in | -in | -te | -e' / -i' | -in | -sin' | -nac | -csi / -csi' |
Podendo ser aplicada no seguinte exemplo[71]:
Existem alguns verbos, como o ya'ij - 'comprar', que não aceitam os sufixos de transitividade, atuando como um verbo intransitivo.[72]
Os verbos da língua chimané utilizam de um predicado complexo por não conterem o modo infinitivo(comer, dançar, cantar) a partir de dois verbos para criar um sentido similar ao infinitivo e ambos verbos serem conjugados.[73]
Os verbos reflexivos são classificados e compostos pela presença dos sufixos específicos. Existe uma distinção de gênero e relacionada à 1° Pessoa do Plural Inclusivo assim como nos demais principais casos verbais. O sufixo para o masculino é o -ti, já para o feminino, o -ti', e o destinado para a 1° Pessoa do Plural Inclusivo é o -tića'.[74]
O imperativo é marcado pela partícula -ra' ao final ou início dos verbos e pode ser classificado de duas formas: afirmativo ou negativo. A partícula -ra' é adicionada no final ou início dos verbos em afirmações, já na classificação negativa a partícula é adicionada apenas no início unida ao marcador negativo jam.[75]
A probabilidade está associada à partícula -ra' assim como no modo imperativo. A partícula é adicionada sempre posterior ao verbo da frase.[63]
A reduplicação verbal é utilizada com finalidade de frequência, ou seja, a reduplicação tem função de repetir a ação daquele verbo no período de tempo da sentença por meio dos sufixos anexados.[76]
Outra forma de representar a reduplicação e o efeito dela é repetindo uma sílaba do verbo além do sufixo por inteiro.[76]
Os verbos da língua podem ser classificados de três formas quanto à sua temporalidade: passado, presente e futuro.[70][69] A forma de representar o passado pode ser analisada através da partícula jiquej, utilizada para enfatizar o passado nas sentenças e mudanças e o contexto da oração no início das sentenças, sendo preciso interpretar o cenário e entonação para encontrar marcas do pretérito.[69]
A maneira de representar o tempo presente não tem distinção por marcadores, ou seja, é representado na forma bruta das construções sem a necessidade de um marcador para frisar a temporalidade, apenas caso uma partícula seja utilizada apenas no tempo presente, mas com foco distindo da função temporal.[77]
O modo de representar o verbo no futuro ocorre acompanhando o verbo antes ou depois dele através do marcador temporal -ra'. A partícula -ra' é aplicada como marcador de probabilidade e ordem além do marcador temporal futuro, sendo necessária a interpretação e contexto da aplicação frasal.[78]
O verbo ser/estar é adicionado de forma subentendida nas orações e construções frasais, de forma que seja necessária a análise do conteúdo e contexto presente para identificar a presenta do verbo de estado.[63]
O chimané apresenta quatro principais tipos de sentenças: verbais, interrogativos, comparativas e negativas. Como também combinações de sentenças, que podem ser criados diferentes sentidos e focos à oração.[79][80][81]
Sempre há a referência cruzada anexada a algum dos verbos nas sentenças verbais, de forma que possam existir sentenças com uma única palavra conectada a diferentes clíticos ou afixos.[79]
A forma padrão de representar uma sentença verbal é pela ordem de alinhamento SV(O), ou seja, sujeito seguido de verbo e, por fim, o objeto da oração. Entretanto, a depender da construção da sentença, a ordem de alinhamento pode se alterar, como de exemplo, a ordem VS(O), ou seja, verbo seguido de sujeito justaposto ao objeto.[79]
A sentenças interrogativas do chimané são representadas por meio de partículas e pronomes próprios para a distinção ser evidente além dos sinais gráficos específicos "¿...?", mas podendo ser classificadas com base na entonação da oração. Os dois marcadores utilizados para a classificação interrogativa são o ća' e -tin, como também podem ser enquadrados sozinhos os pronomes específicos na frase, tal qual o jedye' - ' o que'.[82][83][84]
A partícula ća' é aplicada no sentido de pontuar a existência da classificação interrogativa na sentença, sendo aplicada no final das frases.[82]
A partícula -tin é utilizada para coroar o sentido de ação, ou seja, sentenciar o agente que é capaz de realizar a ação, sendo colocada anexada ao final do verbo.[83]
Os pronomes interrogativos podem aparecer isolados nas sentenças sem a necessidade dos clíticos e partículas do mesmo modo.[84]
As sentenças comparativas da língua são compostas por dois sufixos para compreender o sentido: -yaij e -yai'. As duas partículas são aplicadas ao final dos substantivos ou verbos considerando qual classe gramatical está prevista a semântica comparativa.[80]
Existe uma forma de aplicar o sentido comparativo em sentenças negativas utilizando as partículas dam' e dadam' além dos sufixos padrões. As partículas dam' e dadam' podem aplicar um efeito similar às construções 'ainda mais', 'ainda melhor' e 'ainda menos'.[80]
As sentenças negativas podem ser representadas por diferentes partículas, que expressam sentidos além da negação do conteúdo frasal. As partículas utilizadas na comunicação são jam e itśi' , ambas com função negação à construção da oração.[81]
As sentenças podem ser marcadas além das partículas jam e itśi' pela presença dos articuladores jedye-dye - 'não, nem tudo, nem um pouco', jun'dyem' - 'negativa enfatizada', juna'dyem' - 'expressão para descrença' e jun' da bo (o) - 'maneira sutil de informar negação'.[81]
A voz passiva pode ser representada por meio de três principais marcadores: ji', -ti e -c. Os marcadores de voz passiva podem ser anexados ao início ou final de substantivos e verbos.[85][86][87]
Existem partículas, normalmente as que mais são aplicadas nas sentenças, com função de ênfase, o que limita a possibilidade de ambiguidade acerca da interpretação e classificação de sentenças.[88]
Pode-se analisar a presença dos marcadores de foco nos exemplos a seguir[89][90][88][91][92]:
Chimané | Português |
---|---|
ćoshva'joi' na mo' jäye' yu | Minha neta estava dormindo (continuidade da ação) |
Añei' na jiquej óćan. | Acabou chovendo aqui (temporalidade) |
Yu ra' ćocte | Vou visitar ele (ação de ir) |
aty räj tsacjise in | A arma estava toda quebrada (ação não presenciada) |
fetsecjoi' ta' | A casca quebrou (ação sem influência externa) |
A língua chimané adotou algumas palavras e alterou a pronúncia delas para possibilitar o encaixe e sincronia com o alfabeto fonético próprio, mesmo sendo independente do espanhol.[93]
Alguns exemplos podem ser compreendidos[93]:
Chimané | Espanhol | |
---|---|---|
Pilha | píra | pila |
Quilo | quíro | kilo |
Bola | peroťa | pelota |
Papel | paper | papel |
Brincar de bola | peroťaij | jugar a la pelota |
A gramática chimané apresenta onomatopeias em sua composição frasal.[94]
O vocabulário chimané é aplicado em diferentes campos semânticos e léxicos, abarcando palavras específicas com e sem a necessidade do uso integral de clíticos a fim de gerar sentido. Oss casos do dia-a-dia estão, normalmente, relacionados à vida comercial, retrato do contato com o Rio Maniqui e agricultura tradicional.[95][96]
Chimané | Português |
---|---|
A tyu' tabedye' tui' tsun. | Nós estamos trazendo peixe agora. |
¿Jana' ca' jäquem tabedye'? | Onde você conseguiu o peixe? |
Oij tabedye' tsique'cansi'. | Esse peixe veio da lagoa. |
Yu ma'je' ñibe'jeye tabedye' dam'. | Eu quero te presentear com um pouco de peixe. |
Judye' yoshoropaij. | Legal, muito obrigado. |
¿Jana' bura' titso'je'? | Onde eu posso pegá-lo? |
Ocan yúsi'ćan aca' jäm'. | Aqui em minha casa, seria legal. |
Chimané | Português |
---|---|
Yómoi' Señor, sóbaqui tsuń. | Boa tarde, senhor. Vinhemos visitá-lo (contexto em loja comercial). |
Yómoi' tyä, sisvac ä. | Boa tarde, entrem. |
¿Mo'ya' adac yovi'? | Tem anzóis? |
Mo'ya'. ¿Ma'je' ya'ij mi'in? | Tem sim. Vocês querem comprar? |
Tsuń nash ma'je'. ¿Juñucsi'che' ya'i'? | Queremos sim. Quanto custam? |
¿Ju'ñis ma'je' um? | Qual delas vocês querem? |
Méquis nash ma'jeij. | Quero como essa. (Sinalização visual) |
Oij nash jijcai' pärä' peso. | Irão custar dois pesos. |
Yu ra' ya'ij ćanam'. | Irei comprar cinco. |
Judye'. | Certo. |
Chimané | Português |
---|---|
naijoi' | bom dia |
yómoi' | boa tarde |
quichćanjoi' | boa noite |
judye' | certo / tudo bem |
yoshoropaij | obrigado |
¿Jana' ra' ... quia'? | Onde ... deve estar agora? |
O sistema de numeração da língua pode ser elencado de suas formas: numeração cardinal e ordinal.[86]
Chimané | Português |
---|---|
yiri -ty / -s | um / uma |
yiri' | um |
pärä' | dois |
chlbin | três |
vajpedye' | quatro |
ćanam' | cinco |
jäbän | seis |
yävätidye' | sete |
quenćan | oito |
araj tac | nove |
yiri' tac | dez |
yiri' tac yiris jiyi' | onze |
pärä' qui' tac | vinte |
chibin qui' tac | trinta |
araj tac qui' tac | noventa |
yiri' cien | cem |
pärä qui' cien | duzentos |
yiri' mir | mil |
pärä qui' mir | dois mil |
Chimané | Português |
---|---|
yiri'-yi'si' | primeira |
yiri'-yityi' | primeiro |
pärä-yi'si' | segunda |
pärä-yityi' | segundo |
chibin-yi'si' | terceira |
chibin-yityi' | terceiro |
Chimané | Português |
---|---|
ococo | sapo |
uva' | arara |
äbäbä' | cururu |
avaro' | papagaio |
achuj | cachorro |
isbara' | mico |
óto | capivara |
óya | minhoca |
urube | bicho-preguiça |
ätyäña | joaninha |
meme' | tartaruga |
sucyi | gato |
As Nações Unidas redigiram, dentre as 301 línguas e dialetos, a Declaração Universal dos Direitos Humanos em chimané. Está sendo representado o primeiro artigo da declaração em português e chimané na tabela a seguir[100][101]:
Chimané | Português |
---|---|
Yiri'-yityi'
Räj mun'tyi' naeja' vaj cäts vajo'meja'dye, tupujdyi'jyeja junchuc ra' chijoj coja' jemoñe' jäm jitica'cuitsun judyeya' yoctyi'tum in. |
Primeiro
Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade. |
A língua chimané foi citada no documentário "Los Antiguos",[102] produção desenvolvida pelo Gran Consejo Tsimane', publicado como material público no acervo da UNESCO.[102]