Movimento browniano fracionário

Em teoria das probabilidades, o movimento browniano fracionário (MBF), também chamado de movimento browniano fractal, é uma generalização do movimento browniano. Diferentemente do movimento browniano clássico, os incrementos do MBF não precisam ser independentes.[1] O MBF é um processo gaussiano de tempo contínuo em , que começa em zero, tem valor esperado zero para todo em e possui a seguinte função de covariância:

em que é um número real em , chamado de índice de Hurst ou parâmetro de Hurst, associado com o movimento browniano fracionário. O expoente de Hurst descreve a irregularidade do movimento resultante, sendo que um valor maior leva a um movimento mais suave. Foi introduzido por Benoit Mandelbrot and John W. Van Ness em 1968.[2]

O valor de determina o tipo de processo do MBF:

  • Se , então, o processo é de fato um movimento browniano ou um processo de Wiener;
  • Se , então, os incrementos do processo estão positivamente correlacionados;
  • Se , então, os incrementos do processo são negativamente correlacionados.

O processo do incremento, , é conhecido como ruído gaussiano fracionário.

Há também uma generalização do movimento browniano fracionário, o movimento browniano fracionário de n-ésima ordem (MBF-n).[3] O MBF-n é um processo gaussiano, autossimilar, não estacionário cujos incrementos de ordem são estacionários. Para , o MBF-n é um MBF clássico.

Assim como o movimento browniano que generaliza, o movimento browniano fracionário recebe este nome em homenagem ao botânico escocês Robert Brown. O ruído gaussiano fracionário recebe este nome em homenagem ao matemático alemão Carl Friedrich Gauss.

Plano de fundo e definição

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Antes da introdução do movimento browniano fracionário, Paul Lévy usou em 1953 a integral fracionária de Riemann–Liouville para definir o processo:[4]

em que a integração é em relação à medida de ruído branco . Esta integral se revelou inadequada para aplicações do movimento browniano fracionário devido a sua ênfase excessiva na origem.[2]

Em vez disso, a ideia é usar uma integral fracionária de ruído branco diferente para definir o processo, a integral de Weyl:

para (e, da mesma forma, para ).

A principal diferença entre o movimento browniano fracionário e o movimento browniano regular é que, enquanto os incrementos no movimento browniano são independentes, o oposto se aplica ao movimento browniano fracionário. Esta dependência significa que, se houver um padrão crescente nos passos anteriores, então, é provável que o passo seguinte também seja crescente (se ).

Autossimilaridade

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O processo é autossimilar, já que em termos de distribuições de probabilidade:[5]

Esta propriedade se deve ao fato de que a função de covariância é homogênea de ordem e pode ser considerada uma propriedade fractal. O movimento browniano fracionário é o único processo gaussiano autossimilar.

Incrementos estacionários

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O movimento browniano fracionário tem incrementos estacionários:

Dependência de longo intervalo

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Para , o processo exibe dependência de longo intervalo:[6]

Caminhos amostrais são diferenciáveis em quase lugar nenhum. Entretanto, quase todas as trajetórias são contínuas de Hölder de qualquer ordem estritamente menor que . Para cada trajetória deste tipo, para todo e para todo , existe uma constante , tal que:

para .

Com probabilidade 1, o gráfico de tem tanto dimensão de Hausdorff, como dimensão de caixa igual a .

Assim como para o movimento browniano regular, é possível definir integrais estocásticas em relação ao movimento browniano fracionário, comumente chamadas de "integrais estocásticas fracionárias". Em geral, no entanto, diferentemente de integrais em relação ao movimento browniano regular, integrais estocásticas fracionárias não são semimartingales.

Interpretação do domínio de frequência

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Assim como o movimento browniano tem ruído branco filtrado por (isto é, integrado), o movimento browniano fracionário tem ruído branco filtrado por (correspondente à integração fracionária).

Caminhos amostrais

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Ocorrências práticas em computador de um MBF podem ser geradas, ainda que sejam apenas uma aproximação finita.[7] Pode-se pensar que os caminhos amostrais mostram pontos amostrais discretos em um processo de MBF. Estas ocorrências são mostradas abaixo, cada uma com 1.000 pontos de um MBF com parâmetro de Hurst 0,75.

, ocorrência 1
, ocorrência 2
, ocorrência 3

Ocorrência de três tipos diferentes de MBF são mostradas abaixo, cada uma mostrando 1.000 pontos. A primeira tem parâmetro de Hurst igual a 0,15. A segunda tem parâmetro de Hurst igual a 0,55. A terceira tem parâmetro de Hurst igual a 0,95. Quanto mais alto o parâmetro de Hurst, mais suave será a curva.

Método 1 de simulação

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É possível simular caminhos amostrais de um MBF pelo uso de métodos que geram processos gaussianos estacionários com função de covariância conhecida.[8] O método mais simples tem como base o método de decomposição de Cholesky da matriz de covariância, que, em uma grade de tamanho , tem complexidade de ordem .[9] Um método mais complexo, mas computacionalmente mais rápido é o método do encaixe circulante proposto por C. R. Dietrich e G. N. Newsam em 1997.[10]

Suponha que queremos simular os valores do MBF nos tempos , usando o método da decomposição de Cholesky.

  • Forme a matriz em que ;
  • Compute a matriz da raiz quadrada de , isto é, . Falando livremente, é a matriz de "desvio padrão" associada à matriz de variância-covariância ;
  • Construa um vetor de números obtidos independentemente de acordo com uma distribuição gaussiana padrão;
  • Se definirmos , então, produz um caminho amostral de um MBF.
Para computar , pode-se usar por exemplo o método de decomposição de Cholesky. Um método alternativo usa os autovalores de :
  • Já que é uma matriz simétrica e positiva definida, segue-se que todos os autovalores de satisfazem , .
  • Considere a matriz diagonal dos autovalores, isto é, , em que é o delta de Kronecker. Definimos como a matriz diagonal com entradas , isto é, .
Note que o resultado tem valores reais porque
  • Considere um autovalor associado com o autovalor . Defina como a matriz cuja -ésima coluna é o autovalor .
Note que, já que os autovalores são linearmente independentes, a matriz é inversível.
  • Segue-se então que , porque .

Método 2 de simulação

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Também se sabe que[7]

em que é um movimento browniano padrão e

em que é a integral hipergeométrica de Euler.

Se quisermos simular um MBF em pontos :

  • Construa um vetor de números obtidos de acordo com uma distribuição gaussiana padrão;
  • Multiplique-o por componentes por para obter os incrementos de um movimento browniano em . Denote este vetor por ;
  • Para cada , compute:
A integral pode ser eficientemente computada pela quadratura gaussiana.
  1. Sainty, Philippe (1 de setembro de 1992). «Construction of a complex‐valued fractional Brownian motion of order N». Journal of Mathematical Physics. 33 (9): 3128–3149. ISSN 0022-2488. doi:10.1063/1.529976 
  2. a b Mandelbrot, B.; Van Ness, J. (1 de outubro de 1968). «Fractional Brownian Motions, Fractional Noises and Applications». SIAM Review. 10 (4): 422–437. ISSN 0036-1445. doi:10.1137/1010093 
  3. Perrin, E.; Harba, R.; Berzin-Joseph, C.; Iribarren, I.; Bonami, A. (maio de 2001). «nth-order fractional Brownian motion and fractional Gaussian noises». IEEE Transactions on Signal Processing. 49 (5): 1049–1059. ISSN 1053-587X. doi:10.1109/78.917808 
  4. Lévy, Paul (1953). Random functions: general theory with special reference to Laplacian random functions (em inglês). [S.l.]: University of California Press 
  5. Samorodnitsky, Gennady; Taqqu, M. S. (1 de junho de 1994). Stable Non-Gaussian Random Processes: Stochastic Models with Infinite Variance (em inglês). [S.l.]: CRC Press. ISBN 9780412051715 
  6. Beran, Jan (1 de outubro de 1994). Statistics for Long-Memory Processes (em inglês). [S.l.]: CRC Press. ISBN 9780412049019 
  7. a b Decreusefond, L.; Üstünel, A. S. (1 de março de 1999). «Stochastic Analysis of the Fractional Brownian Motion». Potential Analysis (em inglês). 10 (2): 177–214. ISSN 0926-2601. doi:10.1023/a:1008634027843 
  8. Craigmile, Peter F. (1 de setembro de 2003). «Simulating a class of stationary Gaussian processes using the Davies–Harte algorithm, with application to long memory processes». Journal of Time Series Analysis (em inglês). 24 (5): 505–511. ISSN 1467-9892. doi:10.1111/1467-9892.00318 
  9. Dieker, Ton (2013). Simulation of Fractional Brownian Motion (PDF). Nova York: Columbia University Press. Consultado em 24 de julho de 2017 
  10. Dietrich, C.; Newsam, G. (1 de julho de 1997). «Fast and Exact Simulation of Stationary Gaussian Processes through Circulant Embedding of the Covariance Matrix». SIAM Journal on Scientific Computing. 18 (4): 1088–1107. ISSN 1064-8275. doi:10.1137/s1064827592240555