Cortes de Portugal

As Cortes (do termo latino cohors[1]) eram reuniões de carácter consultivo e deliberativo da monarquia tradicional portuguesa, convocadas pelo rei, ou em seu nome, com a presença das diferentes classes sociais estabelecidas três Ordens: o Primeiro Estado, que correspondia ao "braço" do clero; o Segundo Estado, que era o "braço" da nobreza; e o Terceiro Estado, que era o "braço" do povo, que foi mais predominante a partir do momento que se iniciou o Liberalismo em Portugal, nomeadamente na época da Carta Constitucional portuguesa de 1826 que deu um novo rumo ás Cortes substituindo a organização das Cortes Medievais Portuguesas, aplicando a constitucionalidade.[1]

As Cortes nunca seguiram uma periodicidade definida, dependendo da conjuntura socio-política e da vontade do monarca, funcionando por sua convocatória.[1]

Funcionamento

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Os lugares designados para os representantes das cidades, da nobreza e do clero nas Cortes de Évora (1481-82)

As Cortes operavam em sessões ordinárias, antecedidas por sessões solenes.

Na sessão solene era proferido um discurso de abertura, chamado de Oração de Preposição, a cargo de alguém nomeado pelo monarca, onde eram enumerados os motivos da convocação das Cortes.[2][3]

Os trabalhos desenrolavam-se em reuniões separadas de cada um dos três Estado, acabando com a apresentação ao monarca das suas petições ou conclusões, que lhes respondia posteriormente, cabendo-lhe, em caso de impasse ou não, a decisão final. A duração dos trabalhos decorria por tempo indeterminado até que terminassem os assuntos a discutir; pode, contudo, afirmar-se que a sua duração média seria de um mês.[1] Durante o desenrolar das Cortes, o monarca residia na cidade onde se realizavam.[4]

Devido à sua natureza consultiva, os vassalos eram incentivados a apresentarem os seus problemas, atuando o monarca a pedido dos vassalos. Esses pedidos eram formulados em dois principais tipos de documentos:

  • os capítulos particulares: o qual constavam os problemas particulares de cada concelho;[4]
  • os capítulos gerais: produzidos pelos três estados na fase inicial de cada assembleia, e que incluíam questões de alcance mais geral, desde reivindicações corporativas até advertências acerca de temas da actualidade do reino. Nesses pedidos gerais a visão particularista surgia, sem dúvida, mais esbatida.[4]

As Cortes de Portugal na Época Medieval

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No Reino de Portugal, na época medieval, as Cortes eram uma assembleia de representantes das Estados do reino - a nobreza, o clero e a burguesia. Eram convocadas e dispensadas pelo rei de Portugal à sua vontade, no local de sua escolha. As cortes que reuniam todos os três Estados são algumas vezes distinguidas como Cortes-Gerais, em contraste com as assembleias menores que traziam apenas um ou dois dos Estados, para negociar um ponto específico relevante apenas para eles.

Os monarcas portugueses sempre convocaram "cortes reais" intermitentes (Curia Regis), assembleias consultivas de nobres feudais e clérigos das terras (bispos, abades e mestres das Ordens Militares) para se aconselhar sobre assuntos importantes. Essa prática provavelmente se originou no proto-feudalismo do reino visigótico do século VI. Mas, durante o século XIII, com o crescente poder dos municípios, e os reis cada vez mais dependentes das milícias urbanas, as cidades com foral ganharam o direito de participação nas Cortes, através da eleição de procuradores pelo Senado das terras, que as representariam nas reuniões. As Cortes reunidas em Leiria em 1254 por D. Afonso III de Portugal foram as primeiras Cortes portuguesas conhecidas a incluir explicitamente representantes dos municípios. Nisso, Portugal estava acompanhando o padrão nos reinos ibéricos vizinhos (por exemplo, os reis de Leão admitiram representantes da cidade em suas Cortes já em 1188).

Os reis medievais de Portugal continuaram a contar com pequenas assembleias de notáveis, e convocavam Cortes em ocasiões extraordinárias. Estas seriam convocadas se o rei quisesse introduzir novos impostos, mudar algumas leis fundamentais, anunciar mudanças significativas na política externa (por exemplo, ratificar tratados) ou resolver questões de sucessão real, questões em que a cooperação e o consentimento das cidades eram necessários. A mudança de tributação (especialmente solicitando subsídios de guerra) foi provavelmente o motivo mais frequente para a convocação das Cortes. Como os nobres e o clero eram em grande parte isentos de impostos, a fixação de impostos envolveu intensas negociações entre o conselho real e os procuradores das cidades nas Cortes.

Os procuradores não apenas consideravam as propostas do rei, mas, por sua vez, também usavam as Cortes para apresentar petições próprias ao conselho real em uma infinidade de questões, por exemplo, estendendo e confirmando os privilégios das cidades, punindo abusos de funcionários, introduzindo novos controles de preços, restrições aos judeus, promessas de cunhagem etc. A resposta real a essas petições era consagrada em ordenanças e estatutos, dando assim às Cortes o aspecto de uma legislatura. Essas petições eram originalmente referidas como agravos, depois artigos e eventualmente capítulos. Em Cortes-Gerais, as petições eram discutidas e votadas separadamente por cada Estado e exigiam a aprovação de pelo menos dois dos três braços antes de serem encaminhadas ao conselho real. A proposta era então sujeita ao veto real (aceito ou rejeitado pelo rei em sua totalidade) antes de se tornar lei.[5]

No entanto, a extensão exata do poder de Cortes era ambígua. Os reis insistiam em sua antiga prerrogativa de promulgar leis independentemente das Cortes, maioritariamente usando-as de modo a forçar a colaboração dos nobres do reino, sendo que, uma lei promulgada em Corte seria muito mais difícil de refutar depois do ato. O compromisso, em teoria, era que as ordenanças promulgadas em Cortes só podiam ser modificadas ou revogadas por outras Cortes. Mas mesmo esse princípio era frequentemente contornado ou ignorado na prática.

As Cortes provavelmente tiveram seu apogeu nos séculos XIV e XV, atingindo seu ápice quando D. João I de Portugal confiou quase totalmente na burguesia para garantir o seu poder. Por um período após a crise de 1383 a 1385, as Cortes foram convocadas quase anualmente. Mas com o passar do tempo, elas se tornaram menos importantes.

As Cortes de Portugal na Época Moderna

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As Cortes de Tomar de 1581, onde Filipe II de Espanha foi coroado rei de Portugal, por Jan Luyken (detalhe)

Os monarcas portugueses, explorando as riquezas do império português no exterior, ficaram menos dependentes dos subsídios das Cortes e as convocaram com menos frequência. D. João II (r.1481-1495) as usou para quebrar a alta nobreza, mas dispensou-as para outros assuntos. D. Manuel I (r.1495-1521) convocou-as apenas quatro vezes no seu longo reinado. Já na época de D. Sebastião (r.1554-1578), as Cortes eram praticamente irrelevantes.

Curiosamente, as Cortes ganharam uma nova importância com a União Ibérica de 1581, encontrando um papel de representação dos interesses portugueses em relação ao novo monarca Habsburgo. As Cortes desempenharam um papel crítico na Restauração de 1640, quando aclamaram o Duque de Bragança, e desfrutaram de um breve período de ressurgimento durante o reinado de João IV (r.1640-1656). Mas no final do século XVII, viram-se marginalizadas mais uma vez.

É essencial, neste ponto, nos lembrarmos do facto de que houve apenas quatro ocasiões em que as Cortes foram de imensa importância para a História de Portugal: com a coroação de D. João I, nas Cortes de Coimbra de 1385; com a nomeação de D. Pedro, Duque de Coimbra, como regente de D. Afonso V, nas Cortes de Torres Novas de 1438; com a coroação de Filipe I, nas Cortes de Tomar de 1581; e, finalmente, com a aclamação de D. João IV, nas Cortes de Lisboa de 1645-1646. Todas estas ocasiões, por fim confirmando o papel essencialmente legitimador do poder reinante.

As últimas Cortes reuniram-se em 1828 sob as ordens de D. Miguel I.[6] Se bem que a anterior a esta em 1698 apenas ocorreu como mera formalidade de confirmação da nomeação do Infante D. João (futuro D. João V) como sucessor de Pedro II de Portugal. Posteriormente e até esse intervalo, os réis portugueses governaram como monarcas absolutos. Nenhuma Corte foi convocada por mais de um século.

Esse estado de coisas chegou ao fim com o liberalismo que se seguiu < Guerra Civil Portuguesa (1832-1834), que estabeleceu uma constituição e um parlamento, herdeiro das Cortes Gerais e Extraordinárias da Nação Portuguesa, em 1820.

Lista de cortes em Portugal

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Esta é uma lista das cortes realizadas na história de Portugal:

As assembleias constituintes republicanas: a Assembleia Nacional Constituinte de 1911 e a Assembleia Constituinte de 1975 podem ser consideradas sucessoras (ou equivalentes republicanos) das antigas cortes do período monárquico.

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Referências

  1. a b c d Infopédia. «Cortes». Consultado em 1 de maio de 2020 
  2. Manuel Francisco de Barros e Sousa de Mesquita de Macedo Leitão e Carvalhosa (1827). «Memórias e alguns documentos para a história e teoria das Côrtes geraes que em Portugal se celebraram pelos três estados do reino». Consultado em 1 de maio de 2020 
  3. Armindo de Sousa (1989). «A Estratégia Política dos Municípios no Reinado de D. João II» (PDF). Consultado em 1 de maio de 2020 
  4. a b c Pedro Cardim. «Entre o centro e as periferias. A assembleia de Cortes e a dinâmica política da época moderna». Consultado em 1 de maio de 2020 
  5. Manuel António Coelho da Rocha (1851). Ensaio sobre a historia do governo e da legislação de Portugal: para servir de introducção ao estudo do direito patrio. [S.l.]: Coimbra: Imprensa da Universidade. pp. 102–03. http://purl.pt/24734 
  6. Três Estados (1828, maio), Politipédia, 2012
  7. Vicente, Ricardo (2013). Almoxarifes e almoxarifados ao tempo de D. Afonso IV. Coimbra: [s.n.] pp. 50–53 

Ligações externas

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